Perfil Epidemiológico das internações por neoplasia maligna de estômago registradas pelo Sistema Único de Saúde no Estado de Minas Gerais – Brasil
Palavras-chave:
Neoplasias malignas, Estômago, Vigilância Epidemiológica, Promoção da SaúdeResumo
Minas Gerais é o estado do Sudeste brasileiro com maior taxa bruta de mortalidade por câncer gástrico. A partir desse panorama epidemiológico, este estudo descreve o perfil das internações por neoplasia maligna de estômago (CID 10- C16) pelo Sistema Único de Saúde (SUS) no estado de Minas Gerais, 2008 a 2019, pela análise quantitativa, descritiva e observacional dos dados do Sistema de Informação Hospitalar do SUS (SIH/SUS). Registraram-se 39.164 internações e 6.071 óbitos. O Coeficiente de Internação (CI) e a Letalidade Hospitalar (LH) médios anuais foram 5,6/100 mil habitantes e 15,5%, respectivamente. As maiores incidências foram no sexo masculino (66,9%) e na faixa etária de 60 anos ou mais (60,7%). O tempo e o gasto médios por internação foram 7,4 dias e R$2988,07, respectivamente. O estado assemelha-se epidemiologicamente à realidade nacional na maioria dos achados. Evidencia-se, pois, a utilidade dos dados de morbimortalidade hospitalar para traçar melhores estratégias de saúde.
Downloads
Introdução
As neoplasias ainda são uma das principais causas de morte no mundo. Para o Brasil, as estimativas indicam que, para cada ano de 2020-2022, irão ocorrer 625 mil novos casos. Dentre os mais incidentes, a neoplasia maligna de estômago ocupará a quinta posição com 21 mil casos. Já na população masculina, será a quarta neoplasia mais frequente (5,9%) ([1]).
Na região Sudeste, o câncer de estômago é o quarto tipo mais frequente nos homens, com quase 14 casos para cada 100 mil habitantes. Já nas mulheres, ocupa a sétima posição, com 7,30 casos para cada 100 mil habitantes ([1]). Dessa forma, observa-se, no país, maior incidência dessa doença entre homens, sobretudo na faixa dos 70 anos de idade, sendo que mais da metade dos pacientes diagnosticados com essa neoplasia tem mais de 50 anos. ([2]).
Além disso, a incidência dos vários tipos de tumores pode variar em relação aos indicadores socioeconômicos da população. Nesse contexto, os tumores que atingem o estômago, assim como do colo do útero e da cabeça e pescoço, incluem os grupos que estão mais associados a piores níveis socioeconômicos ([2]).
O principal fator de risco para a neoplasia maligna de estômago é a infecção por Helicobacter pylori, mas outros fatores incluem, por exemplo, o excesso de peso, tabagismo, consumo de álcool e parentesco de primeiro grau com câncer de estômago ([1]). Dentre os seus tipos histológicos mais frequentes está o adenocarcinoma, que pode representar até 95% dos casos diagnosticados ([3]).
Na região Sudeste do país, Minas Gerais é o estado com a maior taxa bruta de mortalidade por neoplasia maligna de estômago. No ano de 2019, essa taxa no estado foi de 4,76 para cada 100.000 habitantes, e só perde para o Amazonas (5,28), Pará (5,10), Rio Grande do Norte (5,05), Paraíba (4,93) e Rondônia (4,92) ([1]). Apesar da incidência estar em declínio nos últimos anos, sobretudo devido à erradicação do Helicobacter pylori, a taxa de mortalidade continua elevada ([3]).
Nesse sentido, aliado à identificação e à vigilância adequada de pacientes em risco elevado para essa neoplasia, a análise epidemiológica dos casos de neoplasia maligna de estômago é um pilar essencial para favorecer o diagnóstico precoce e a redução da mortalidade pela doença. A detecção precoce é, portanto, definidora de melhores resultados no tratamento, já que o câncer de estômago é uma doença com prognóstico ruim e com baixa taxa de sobrevida nos estágios mais avançados ([4]).
Portanto, considerando que o Brasil é um país com grandes dimensões territoriais, tanto o manejo hospitalar quanto o prognóstico da doença sofrem muita variação entre as diferentes regiões brasileiras ([3]). Por isso, o estudo epidemiológico detalhado é crucial para esclarecer as particularidades de cada região e direcionar melhores estratégias de saúde para prevenção da neoplasia maligna de estômago. Nesse sentido, esse estudo visa descrever o perfil epidemiológico das internações por neoplasia maligna de estômago pelo SUS na população residente em Minas Gerais no período de 2008 a 2019.
Material e Métodos
Estudo epidemiológico de natureza quantitativa, descritiva e observacional. A pesquisa foi realizada a partir de dados secundários do Sistema de Informação Hospitalar (SIH) do Ministério da Saúde, disponíveis de modo público no Departamento de Informática do SUS (DATASUS), em que está disposto o sistema TABNET contendo os dados referentes às estatísticas vitais (Mortalidade) e de internações. A população em estudo será todos os pacientes que tiveram internação pelo SUS com diagnóstico de neoplasia maligna de estômago (CID 10 - C16), registrados pelo SIH e residentes nos municípios do Estado de Minas Gerais no período de 2008 a 2019.
Dados populacionais utilizados para os cálculos epidemiológicos foram obtidos através do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). No estudo, são apresentadas as variáveis de observação/internação e de desfecho conforme segue: número de internações hospitalares por macrorregião de saúde e por ano de atendimento; internações por sexo e faixa etária; média de permanência hospitalar (dias); gasto médio e gasto total das internações (real - R$); taxa de mortalidade e número de óbitos por ocorrência. Os dados coletados serão tabulados e analisados no software Microsoft Excel®. Os resultados do estudo serão apresentados por meio de gráficos, tabelas e quadros e será feita uma análise descritiva e comparativa dos dados.
Foi calculado a taxa de letalidade hospitalar (razão entre o número de óbitos e o número de internações, multiplicado por 100) e o Coeficiente de Internação hospitalar (razão entre o número de internações e a população residente em Minas Gerais, multiplicado por 100 mil) para cada ano, de 2008-2019. Os dados populacionais referem-se ao Censo de 2010 do IBGE.
Por se tratar de um estudo realizado a partir de dados secundários, não foi necessária a submissão desse trabalho ao Comitê de Ética em Pesquisa, por seguimento das normas éticas do País, de acordo com a Resolução do Conselho Nacional de Saúde nº 510, de 7 de abril de 2016 ([5]). Além disso, como os dados que serão utilizados são de domínio público (disponíveis pelo DATASUS), não será necessário um Termo de Consentimento Informado.
Resultados
No período de 2007 e 2017, foram registradas 39.164 hospitalizações por neoplasia maligna de estômago em Minas Gerais e 6.071 óbitos hospitalares. A tabela 1 apresenta a distribuição do número de internações e de óbitos, além do coeficiente de internação (CI) e da taxa de letalidade hospitalar (LH) por ano de atendimento. O CI médio anual foi de 15,6/100 mil habitantes e a LH média anual de 15,5%.
Ano | Internações | % | Óbitos | % | CI | LH |
2008 | 2110 | 5,4 | 383 | 6,3 | 10,7 | 18,2 |
2009 | 2200 | 5,6 | 440 | 7,2 | 11,1 | 20,0 |
2010 | 2353 | 6,0 | 445 | 7,3 | 11,8 | 18,9 |
2011 | 2825 | 7,2 | 468 | 7,7 | 14,1 | 16,6 |
2012 | 3131 | 8,0 | 544 | 9,0 | 15,5 | 17,4 |
2013 | 3395 | 8,7 | 519 | 8,5 | 16,7 | 15,3 |
2014 | 3408 | 8,7 | 522 | 8,6 | 16,6 | 15,3 |
2015 | 3654 | 9,3 | 533 | 8,8 | 17,7 | 14,6 |
2016 | 3811 | 9,7 | 588 | 9,7 | 18,3 | 15,4 |
2017 | 3946 | 10,1 | 553 | 9,1 | 18,9 | 14,0 |
2018 | 4071 | 10,4 | 549 | 9,0 | 19,3 | 13,5 |
2019 | 4260 | 10,9 | 527 | 8,7 | 20,1 | 12,4 |
Total | 39164 | 100 | 6.071 | 100 | 15,6 | 15,5 |
No período do estudo, houve um aumento progressivo do número de internações (Figure 1) e do coeficiente de internação hospitalar (CI), sendo então o ano de 2019 com os maiores valores (4260 internações; 20,1 internações/100 mil hab, respectivamente), quando foi registrada uma frequência de 10,9% do total de internações (Table 1). Apesar disso, a letalidade hospitalar sofreu redução ao longo dos anos, sendo o ano de 2009 com a maior taxa de letalidade hospitalar (20%) (Figure 2).
O ano de 2016 obteve o maior número de óbitos (588) (Figure 3). Apesar disso, quando se compara o número de óbitos dos anos de 2012 a 2019, observa-se uma estatística que parece se manter ao longo do tempo, sem grandes discrepâncias entre os dados, sendo a média anual de óbitos igual a 505.
Do total de indivíduos internados, 66,9% eram homens (Table 2). O sexo masculino também representou o maior número de óbitos (4.059) (Table 3). A faixa etária com maior prevalência foi entre os pacientes com 60 anos ou mais (60,7%), sendo quase a metade desses na faixa dos 60-69 anos (29%). No quesito raça/cor, houve predomínio das internações de pacientes pardos (48,17%) e brancos (29,46%) (Table 2).
Variável | N | % |
Sexo | ||
Masculino | 26221 | 66,9 |
Feminino | 12943 | 33,0 |
Faixa Etária | ||
até 40 anos | 1993 | 5,0 |
40 a 49 anos | 4194 | 10,7 |
50 a 59 anos | 9203 | 23,5 |
60 a 69 anos | 11374 | 29,0 |
70 a 79 anos | 8948 | 22,8 |
80 anos ou + | 3452 | 8,8 |
Cor/raça | ||
Branca | 11539 | 29,46 |
Preta | 3223 | 8,23 |
Parda | 18865 | 48,17 |
Amarela | 290 | 0,74 |
Indígena | 32 | 0,08 |
Sem informação | 5215 | 13,32 |
Macrorregião de Saúde | ||
Sul | 5262 | 13,4 |
Centro Sul | 2174 | 5,6 |
Centro | 12056 | 30,8 |
Jequitinhonha | 672 | 1,7 |
Oeste | 1762 | 4,5 |
Leste | 1203 | 3,1 |
Sudeste | 4944 | 12,6 |
Norte | 2283 | 5,8 |
Noroeste | 628 | 1,6 |
Leste do Sul | 1975 | 5,0 |
Nordeste | 1196 | 3,1 |
Triângulo do Sul | 1591 | 4,1 |
Triângulo do Norte | 1279 | 3,3 |
Vale do Aço | 2139 | 5,5 |
Total | 39164 | 100 |
Variáveis | Óbitos | LH |
Sexo | ||
Masculino | 4059 | 15,5 |
Feminino | 2012 | 15,6 |
Faixa Etária | ||
até 40 anos | 243 | 12,2 |
40 a 49 anos | 529 | 12,6 |
50 a 59 anos | 1127 | 12,3 |
60 a 69 anos | 1652 | 14,5 |
70 a 79 anos | 1638 | 18,3 |
80 anos ou + | 882 | 25,6 |
Macrorregião de Saúde | ||
Sul | 638 | 12,1 |
Centro Sul | 316 | 14,5 |
Centro | 2011 | 16,7 |
Jequitinhonha | 73 | 10,9 |
Oeste | 313 | 17,8 |
Leste | 228 | 19,0 |
Sudeste | 773 | 15,6 |
Norte | 414 | 18,1 |
Noroeste | 97 | 15,4 |
Leste do Sul | 273 | 13,8 |
Nordeste | 169 | 14,1 |
Triângulo do Sul | 237 | 14,9 |
Triângulo do Norte | 220 | 17,2 |
Vale do Aço | 309 | 14,4 |
Total | 6071 | 15,5 |
Não houve diferença estatística da letalidade hospitalar entre os sexos. Para a faixa etária, a letalidade hospitalar foi maior entre os indivíduos com 80 anos ou mais (25,6%) e, em segundo lugar, entre os indivíduos de 70-79 anos (18,3%) (Table 3).
Na Table 2, também se observa a prevalência da neoplasia maligna de estômago de acordo com as macrorregiões de saúde (MRS) de Minas Gerais. No total, o Estado conta com 14 MRS, sendo que as maiores prevalências da neoplasia são correspondentes ao Centro, Sul e Sudeste, respectivamente, representando juntas mais de 50% das internações (56,8%) (Table 2).
Em contrapartida, as maiores taxas de letalidade hospitalar ficaram para as MRS Leste, Norte e Oeste (19,0%; 18,1%; 17,8%, respectivamente). A MRS Centro contou com o maior número absoluto de óbitos (2.011), que representa aproximadamente 30% de todos os óbitos registrados no Estado (Table 3).
Ainda, Minas Gerais apresentou no período estudado média de permanência na unidade hospitalar de 7,4 dias, com queda de 10,0 dias em 2008 para 5,9 dias em 2019 (Table 4). A faixa etária menor de 1 ano apresentou maior permanência, com média de 11,5 dias no sexo masculino e 13,8 dias no feminino, seguido da faixa etária de 1 a 4 anos, com 7,9 dias no masculino e 13,7 dias no feminino. O sexo feminino apresentou as maiores médias de permanência hospitalar, independente da faixa etária, quando comparado ao sexo masculino (Table 4).
Faixa Etária | Masculino | Feminino |
Menor 1 ano | 11,5 | 13,8 |
1 a 4 anos | 7,9 | 13,7 |
5 a 9 anos | 4,7 | 10 |
10 a 14 anos | 5,8 | 9,8 |
15 a 19 anos | 6,2 | 6,5 |
20 a 29 anos | 6,1 | 6,9 |
30 a 39 anos | 7,1 | 7,5 |
40 a 49 anos | 7 | 7,4 |
50 a 59 anos | 6,9 | 7,1 |
60 a 69 anos | 7,2 | 7,4 |
70 a 79 anos | 7,5 | 8,2 |
80 anos ou + | 7,7 | 8,3 |
Total | 7,2 | 7,6 |
O gasto total em regime público foi de R$ 1.056.273,77 no período analisado, sendo o gasto médio total por internação de R$ 2988,07. Observa-se que o gasto maior foi com a faixa etária de 10 a 14 anos, sendo de R$ 4921,72 para o sexo masculino. Não foi registrado no SIH o valor médio das internações para o sexo feminino para a mesma faixa etária (Table 5).
Faixa Etária | Masculino | Feminino | Total |
Menor 1 ano | 1150,26 | 1880,74 | 1254,62 |
1 a 4 anos | 1082,16 | 1330,86 | 1281,12 |
5 a 9 anos | 682,71 | 887,44 | 785,08 |
10 a 14 anos | 4921,72 | ... | 4921,72 |
15 a 19 anos | 3559,31 | 1480,23 | 3143,49 |
20 a 29 anos | 2364,41 | 2308,92 | 2336,16 |
30 a 39 anos | 2548,06 | 2419,15 | 2478,83 |
40 a 49 anos | 2532,37 | 2659,69 | 2586 |
50 a 59 anos | 3037,52 | 2600,02 | 2901,48 |
60 a 69 anos | 3023,41 | 3220,83 | 3080,35 |
70 a 79 anos | 3567,38 | 3224,87 | 3455,75 |
80 anos e mais | 3232,44 | 2108,82 | 2772,37 |
Total | 3093,89 | 2787,13 | 2988,07 |
Por fim, nota-se que a mortalidade por neoplasia maligna de estômago em Minas Gerais por 100.000 habitantes apresenta valores significativos. Em 2009 foi registrada a maior taxa, sendo de 20% no total. Em relação ao sexo feminino, houve um acréscimo de 3% na taxa de 2018 (12,75%) para 2019 (13,14%). Para o sexo masculino, no mesmo período, houve um decréscimo de 14%. Não houve diferença estatística da taxa média anual de mortalidade para os dois sexos (Table 6). Apesar disso, observa-se uma tendência de decréscimo desse indicador ao longo dos anos em ambos os sexos (Figure 4).
Ano | Masculino | Feminino | Total |
2008 | 18,2 | 18,8 | 18,4 |
2009 | 20,7 | 18,7 | 20,0 |
2010 | 18,8 | 19,4 | 19,0 |
2011 | 16,9 | 15,8 | 16,5 |
2012 | 16,4 | 19,0 | 17,3 |
2013 | 15,5 | 15,3 | 15,4 |
2014 | 14,9 | 14,9 | 14,9 |
2015 | 14,4 | 15,7 | 14,8 |
2016 | 16,0 | 14,6 | 15,6 |
2017 | 14,0 | 13,6 | 13,9 |
2018 | 13,7 | 12,8 | 13,3 |
2019 | 11,7 | 13,1 | 12,2 |
Total | 15,9 | 16,0 | 15,9 |
Discussão
É notável que a neoplasia maligna de estômago (NME) seja uma importante causa de morbidade e mortalidade em várias partes do mundo, e o número total de casos incidentes e de mortes apresenta variações importantes ao longo dos anos em diferentes regiões. Ao redor do mundo, os números totais de casos e mortes por NME estão aumentando, particularmente pela crescente quantidade de diagnósticos feitos no leste asiático, especialmente na China ([6]). No Brasil o número de casos vem diminuindo ao longo dos anos, passando da primeira causa de câncer em homens para a quarta incidência, sendo que nunca foi responsável por parte significativa dos cânceres em mulheres ([7]).
No estado de Minas Gerais, no período analisado de 2007 a 2017, foram registrados 39.164 hospitalizações por NME, sendo que destes, 6.071 foram a óbito. Importante notar que houve aumento progressivo, ao longo dos anos, do número absoluto das internações e do coeficiente de internação hospitalar (CI), com pico em 2019. De forma semelhante, [4]) também constatou que o Brasil apresentou esse elevado registro de internações por NME na última década, com maior incidência em 2019 e aumento de quase 55% entre os anos de 2010 e 2019, o que pode ser explicado pela maior disponibilidade de exames diagnósticos e do aumento dos diagnósticos de pacientes já em estágios avançados da doença.
Apesar disso, a letalidade sofreu redução ao longo dos anos, como observado no gráfico 3. Em relação à tendência da mortalidade por NME, foi observado também, no gráfico 4, uma progressiva queda ao longo dos anos para ambos os sexos. No Brasil, este achado também está de acordo com o que foi verificado por [8]), que identificou redução nas taxas de mortalidade em ambos os sexos (redução de 38,9% em mulheres e 37,3% em homens).
Essa tendência de queda da mortalidade, também encontrado na revisão de literatura feita por [6]), pode estar relacionado a estratégias de diagnóstico precoce, melhores condições de saúde, redução do tabagismo e acesso a alimentação saudável. Não houve diferença estatística da letalidade hospitalar e da mortalidade entre os sexos, em disconrdância com outros estudos acerca do tema, que observaram maiores taxas para o sexo masculino ([9]; [10]; [11]).
[4]) ainda verificou que a mortalidade da NME no Brasil, na última década, é de 16,9%, o que se assemelha a realidade de Minas Gerais entre os anos de 2008-2019 observada neste estudo, com uma taxa de mortalidade detectada de 15,9%. Quando comparado internacionalmente, [12]) constatou que a mortalidade por câncer de estômago no Brasil, apesar de declinante, ainda caracteriza-se em um padrão de intermediário a alto se comparado a outros países analisados no estudo.
Neste trabalho, foi identificado uma predominância maior entre homens (66,9%) tanto no número de internações quanto no de óbitos, embora a letalidade hospitalar tenha sido semelhante entre os sexos. De acordo com o estudo de [13]), essa predominância do sexo masculino, explicada principalmente por fatores ambientais (exposição a alimentos salgados, tabagismo e etilismo), vem diminuindo ao longo dos anos desde o século passado, passando de uma razão de 2,8 homens para cada mulher, para apenas 1,6 de 1932 a 1968, embora ainda não haja consenso se essa mudança epidemiológica realmente está acontecendo. [14]), [15] e [13] também constataram uma tendência de aumento da incidêndia da doença entre as mulheres, mesmo com a predominância ainda entre os homens.
Além disso, a idade encontrada como sendo a mais prevalente entre os casos de câncer de estômago - pacientes com 60 anos ou mais - também foi encontrado em outros trabalhos ([13]; [6]; [7]), evidenciando a importância de se dar maior atenção aos pacientes idosos com fatores de risco associados para o desenvolvimento de câncer de estômago. Apesar disso, segundo [16], há uma tendendência de aumento da incidência da NME em pessoas mais jovens, o que tem agravado o diagnóstico mais tardio e dificultado um prognóstico mais favorável para o câncer gástrico. Para [17]), o diagnóstico tardio é um dos grandes limitadores do tratamento dessa patologia, o qual pode envolver cirurgia, quimioterapia e/ou radioterapia, e o tipo de terapia escolhida dependerá da histologia, do tamanho, do local e da extensão do tumor.
Embora, tenha-se encontrado predominância mais elevada entre pacientes pardos e brancos (48,17% e 29,46% respectivamente), estudos correlacionaram a maior incidência de câncer de estômago principalmente a fatores ambientais, e menos a fatores de raça/cor de pele ([6]).Por isso, são necessários mais estudos voltados para possíveis diferenças entre pacientes de etnias diferentes.
Em relação às macrorregiões de saúde (MRS) de Minas Gerais, observou-se neste estudo que o número de internações por NME concentraram-se nas regiões Centro, Sul e Sudeste, de acordo com a tabela 2. Conforme o plano diretor de Minas Gerais, o ordenamento dos serviços de saúde funciona de acordo com as densidades tecnológicas, que não possuem distribuição homogênea, sendo mais concentradas justamente nas regiões Centro e Sul do Estado ([18]).
A média da permanência hospitalar dos pacientes internados em regime público foi de 7,4 dias, sendo o sexo feminino com os maiores valores independente da idade. Segundo um estudo sobre as internações hospitalares por neoplasias no Brasil, essa variável pode servir como parâmetro para avaliar a eficiência da gestão hospitalar, a rotatividade dos leitos, assim como a qualidade da prática clínica adotada, entretanto, diversos fatores podem influenciá-la, como a idade, o estadiamento do câncer e as comorbidades associadas. Sendo assim, o uso isolado do tempo de internação não é sufiiente para se tirar conclusões sobre a qualidade do uso (bom ou mau) dos recursos hospitalares ([19]).
Por fim, este estudo analisou também os gastos com pacientes acometidos por câncer gástrico. Em regime público, o gasto total no período analisado foi de R$ 1.056.273,77; representando um gasto médio de R$2988,07 por internação. Esse valor tende a ser maior de acordo com o estadiamento do câncer ao momento do diagnóstico: enquanto em pacientes com estadio I, os procedimentos incluem dissecção submucosa endoscópica, gastrectomias parciais e cirurgia com quimioterapia adjuvante, pacientes de estadio III necessitaram de procedimentos mais invasivos, custosos e que necessitaram de maior tempo de internação ([20]). Pacientes no estadio IV apresentaram custos significativamente maiores e intervenções mais drásticas do que pacientes em estadio I, o que indica que o estadio do câncer foi um dos fatores mais importantes relacionados aos custos do tratamento ([20]).
Um exemplo importante de manejo dos casos de câncer gástrico é o Japão, país com elevada incidência da doença, cujo conhecimento epidemiológico propiciou o estabelecimento de medidas direcionadas ao rastreamento da neoplasia, bem como de realização de exames endoscópios periódicos com indicação correta. Essas estratégias permitem o diagnóstico precoce, tratamento mais eficaz e menos agravos à saúde dos pacientes, com um custo menor ([7]).
As limitações deste estudo referem-se àquelas ligadas à utilização de banco de dados secundários, dentre elas a falta de dados sobre o gasto médio das internações para a população feminina na faixa etária dos 10 aos 14 anos, o que impossibilitou a análise fiel e comparativa dos dados para essa variável e faixa etária. Esse fato aponta para a necessidade de melhorias na coleta de informações e no registro das notificações para a base de dados.
Conclusão
Conforme observado no estudo, evidenciou-se a semelhança da situação epidemiológica do câncer gástrico em Minas Gerais quanto à realidade nacional. Apesar da redução da letalidade hospitalar anual, a incidência e os custos de internação continuam altos, talvez pelo atraso no diagnóstico, que pode ser o principal desafio a ser superado.
É notória a necessidade de novos estudos epidemiológicos que facilitem a realização do diagnóstico precoce e compreensão das características populacionais do estado, a fim de garantir que o número de casos de câncer gástrico e - principalmente - sua letalidade e morbimortaliade sejam reduzidos, por meio de intervenções menos agressivas em estadios precoces da doença, com melhores desfechos, menos custos e mais qualidade de vida aos pacientes.
Referências
Barchi, L.C., Ramos, M.F.K.P., Dias, A.R., Andreollo, N.A., Weston, A.C., Lourenço, L.G., & Malheiros, C.A... (2020). II Consenso Brasileiro de Câncer Gástrico realizado pela Associação Brasileira de Câncer Gástrico. São Paulo: Arquivos Brasileiros de Cirurgia Digestiva, 33(2).
Brasil. Resolução nº 510, de 07 de abril de 2016.Dispõe sobre as normas aplicáveis a pesquisas em Ciências Humanas e Sociais. (2016). Conselho Nacional de Saúde. Consultada em Outubro 2020, em http://conselho.saude.gov.br/resolucoes/2016/Reso510.pdf.
Da Silva, J.A.G. (2019). Estimativa 2020: incidência de câncer no Brasil. Rio de Janeiro: INCA, 120.
Souza, T., Migowski, A., Ribeiro, C.M., Santos, M., Pla, M., Dias, M.B., & Melo, M. (2020). ABC do câncer: abordagens básicas para o controle do câncer. 6.ed. Rio de Janeiro: INCA.
Dos Santos, H.L.P.C., Maciel, F.B.M., & de Oliveira, R.S. (2020). Internações Hospitalares por Neoplasias no Brasil, 2008-2018: Gastos e Tempo de Permanência. Revista Brasileira de Cancerologia, 66(3).
Duarte, A. C. S. F., Wanderley, R.L., Silva, G.J.T., Silva, Z.C., Souza, A.A., Torres, V.C., & Silva, E.B. (2020). Perfil epidemiológico das internações por neoplasia maligna de estômago durante a última década no Brasil. Brazilian Journal of Development, 6(10), 78528-78539.
Etemadi, A., Safiri, S., Sepanlou, S.G., Ikuta, K., Bisignano, C., Shakeri, R., & Sekerija, M... (2020). The global, regional, and national burden of stomach cancer in 195 countries, 1990-2017: a systematic analysis for the Global Burden of Disease study 2017. The Lancet Gastroenterology & Hepatology, 5(1), 42-54.
Ferlay, J., Soerjomataram, I., Dikshit, R., Eser, S., Mathers, C., Rebelo, M., & Parkin, D.M. (2015). Cancer incidence and mortality worldwide: sources, methods and major patterns in GLOBOCAN 2012. International journal of cancer, 136(5), E359–E386.
Gonçalves, F.S., de Melo Sarges, R., Ramos, M.A., José, M., Souza, C., Nemer, C.R.B., & de Oliveira Menezes, R.A. (2020). Perfil clínico epidemiológico do câncer gástrico: revisão integrativa. PubSaúde, 3, a041.
Guerra, M.R., Bustamante-Teixeira, M.T., Corrêa, C.S.L., Abreu, D. M. X. D., Curado, M.P., Mooney, M., & Malta, D.C... (2017). Magnitude e variação da carga da mortalidade por câncer no Brasil e Unidades da Federação, 1990 e 2015. Revista Brasileira de Epidemiologia, 20, 102-115.
Instituto Nacional de Câncer José Alencar Gomes da Silva. (2014). Atlas on-line de mortalidade. Rio de Janeiro: INCA. Consultada em Maio, 2021, em https://www.inca.gov.br/MortalidadeWeb/pages/Modelo06/consultar.xhtml#panelResultado.
Jacob, C.E., Bresciani, C., Gama-Rodrigues, J.J., Yagi, O.K., Mucerino, D., Zilberstein, B., & Cecconello, I. (2009). Behavior of gastric cancer in Brazilian population. ABCD. Arquivos Brasileiros de Cirurgia Digestiva (São Paulo), 22, 29-32.
Kim, J. H., Kim, S. S., Lee, J. H., Jung, D. H., Cheung, D. Y., Chung, W. C., & Park, S. H. (2018). Early Detection is Important to Reduce the Economic Burden of Gastric Cancer. Journal of gastric cancer, 18(1), 82–89.
Lacerda, K.C., Rocha, R.C., Melo, M.M.D., & Nunes, L.C. (2014). Mortalidade por câncer de estômago em Volta Redonda-RJ, 1981-2008. Epidemiologia e Serviços de Saúde, 23, 519-526.
Malachias, I., Leles, F.A.G., & Pinto, M.A.S (2011). Plano diretor de regionalização da saúde de Minas Gerais (PDR/MG). Belo Horizonte, MG: Secretaria de Estado de Saúde de Minas Gerais. Consultada em Agosto, 2021, em https://www.novaconcursos.com.br/arquivos-digitais/erratas/15885/20203/plano-diretor-regionalizacao.pdf.
Oliveira, J. F. P. (2010). Câncer de estômago: incidência, mortalidade e sobrevida no município de Fortaleza, Ceará. Tese de Doutorado, Escola Nacional de Saúde Pública Sérgio Arouca, Rio de Janeiro, Brasil.
Rêgo, M. A. V., Leão, C. R., Teixeira, U. F., & de Souza Filho, P. R.A. (2011). Tendência da mortalidade por câncer de estômago em Salvador e no estado da Bahia, Brasil, de 1980 a 2007. Revista Baiana de Saúde Pública, 35(4), 869-869.
Silva, G. A. E., Gamarra, C. J., Girianelli, V. R., & Valente, J. G. (2011). Tendência da mortalidade por câncer nas capitais e interior do Brasil entre 1980 e 2006. Revista de Saúde Pública, 45(6), 1009-1018.
Song, H., Zhu, J., & Lu, D. (2016). Molecular‐targeted first‐line therapy for advanced gastric cancer. Cochrane Database of Systematic Reviews, (7).
Steevens, J., Botterweck, A. A., Dirx, M. J., van den Brandt, P.A., & Schouten, L. J. (2010). Trends in incidence of oesophageal and stomach cancer subtypes in Europe. European journal of gastroenterology & hepatology, 22(6), 669-678.
Takatsu, Y., Hiki, N., Nunobe, S., Ohashi, M., Honda, M., Yamaguchi, T., & Sano, T... (2016). Clinicopathological features of gastric cancer in young patients. Gastric Cancer, 19(2), 472-478.
Publicado
Como Citar
Edição
Secção
Licença
Direitos de Autor (c) 2022 Ana Laura Stefani, Stefan Vilges Oliveira
Este trabalho encontra-se publicado com a Licença Internacional Creative Commons Atribuição-NãoComercial-CompartilhaIgual 4.0.